15 fevereiro, 2006

Re: As Caricaturas

Voando pela blogosfera, notei que ainda há bastantes focos de incêndio causados pela crise das caricaturas de Maomé. Já na minha última postagem tinha aflorado ligeiramente o meu ponto de vista, mas não pude deixar esta polémica passar ao lado deste blog. Confesso que esta semana o que me estava mesmo a apetecer fazer era escrever sobre o Mestre Agostinho da Silva, mas enfim: dei um passeio pela blogosfera e, tal como quem vai a passar pela rua e sente algo quente e mole debaixo do sapato, também eu me deparei com vários comentários depreciativos da atitude sensata do nosso ministro dos negócios estrangeiros.

Ora, se há algo de que Portugal se pode orgulhar, é de ter sido um país cuja contribuição para a Paz (e aqui eu falo de paz na sua plena definição de concórdia e respeito entre culturas e não a simples ausência de guerra que alguns defendem) tem superado largamente todas as suas contribuições em guerras. Na verdade, à excepção da nossa hospitalidade perante a cimeira dos Açores, Portugal tem tido bastante sensatez na sua política externa. Analisemos, portanto, o paradigma português sob dois pontos de vista: o lado da imprensa e o lado da política.

A imprensa portuguesa, até mesmo o 24 Horas e a TVI, tem tratado esta questão com uma sensatez e uma delicadeza exemplares. Não só não temos publicado as ditas caricaturas como tenho noção que as opiniões do lado europeu e do lado islâmico têm estado em equilíbrio quanto a tempos de exibição e importância dada. Mais do que isso, os nossos veículos informativos não cessam de mencionar também a muitas manifestações pacíficas de muçulmanos em todo o mundo (mesmo em Marrocos, que é um país islâmico). Tal como escreveu a autora do Dedos de Conversa, é agradável viver num país onde os media medem o nível da água antes de começarem a ferver. Isto para não falar que, segundo o que parece ser a política editorial de alguns orgãos informativos, o caso da avozinha que vive num barracão sem luz, nem tecto, nem água, nem nada, é mais digno de ser passado na televisão nacional à hora de jantar que ser alvo de um processo contra o estado por não cumprir com as sua obrigações sociais.

Viremos então as costeletas na brasa e falemos da parte política. Ora, o nosso MNE disse, e passo a citar: “Portugal lamenta e discorda da publicação de desenhos e/ou caricaturas que ofendem as crenças ou a sensibilidade religiosa dos povos muçulmanos”. Dos muçulmanos e de qualquer povo! A Europa, que durante tantos anos proclamou que a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros, agora parece querer baixar ao nível intelectual que tinha aquando da Idade Média. A frase que traduz a nossa política em relação a este assunto não é a frase de um país de brandos costumes (como defendem uns quantos amigos do patologista, o qual, já agora, deveria fazer uma certa profilaxia às suas ideias). É antes uma posição tomada por uma entidade que defende radicalmente os ideais de paz e liberdade. Talvez até os nossos jornalistas se tenham apercebido disso.

Pior do que isso, foi a insinuação de um comentário venenoso por parte do embaixador do Irão em Portugal ao dizer que o nosso país teve a melhor reacção europeia ao incidente das caricaturas. Isto é mau? Numa altura em que a Europa se afunda em radicalismos estúpidos e qualquer liberdade de espírito (religiosa ou de pensamento) se afunda no exagero das liberdades de imprensa que são aproveitadas por grupos extremistas no seu amor, quer à polémica, quer aos lucros que a publicação destes escândalos trazem. Numa altura em que é preciso chama as partes ao bom senso, custará assim tanto dizer “quem têm sido os maiores agressores nos últimos tempos? Somos nós! Portanto, cabe-nos a nós a iniciativa e cabe-lhes a eles também dar passos nesse sentido e não utilizarem a violência porque os protestos são legítimos mas há muitas maneiras pacíficas de fazer protesto”? Ou será melhor colocarmos o nosso submarino sucata ao largo de Marrocos, e pedirmos à GNR para ir dar uma volta até Teerão? E já gora, porque não pedir ao nosso amigo patologista para de voluntariar no exército americano para apoiar a invasão do médio oriente?

4 comentários:

  1. Não discordo completamente do que diz.
    Discordo é da forma subserviente que foi assumida pela nossa política externa. Freitas não tinha que dizer nada, agora não devia era ter-se posto de cócoras...

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  2. Caro Filipe, se me conhecesses sabias que nunca apoiei invasões do Iraque, do Afeganistão, ou a imposição que os americanos sempre quiseram fazer da sua democracia para outros povos e latitudes.
    Quanto às caricaturas, penso que já se tem exagerado na sua republicação constante. No entanto, tal como "gozamos" com o nosso Deus, também podemos fazer humor com o dos outros. É natural que os muçulmanos não gostem ou se sintam ofendidos. Não é natural que matem, incendeiem casas, e ameaçem por causa disso.
    Quanto ao elogio do embaixador do Irão, não posso gostar, uma vez que vem de um país que não respeita qualquer valor de liberdade. Não há liberdade de imprensa, não há liberdade religiosa, não há liberdade para as mulheres. Enquanto assim fôr, o Irão não tem o direito de exigir nada da Europa.
    A diferença é que nós gozamos com Maomé, mas um muçulmano pode ter mesquitas na Europa e rezar ao seu Deus. O contrário, não é possivel.

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  3. Caros co-bloggistas, em primeiro lugar gostava de vor pedir desculpa pelos vossos comentários não terem sido publicados imdediatamente; foi um erro nas configurações do blog que já tratei de resolver.

    Demorei um pouco a voltar a escrever sobre o assunto, já que tenho dois olhos, mas sem o computador só escrevo com uma mão, logo, achei sensato tentar usar-los em porporcionalidade.

    De facto, até admito que os elogios do embaixador do Irão possam ser equivalntes aos de Pinochet, mas o que importa realçar é que o mundo islâmico não se resume ao Irão: e por isso até posso considerar legítima a pretensão do Irão em ver a atitude religiosa que professa (em comunhão com os restantes países islâmicos) respeitada.

    Por outro lado, não considero as arfirmações do nossos MNE como um colocar de cócoras. Afinal de contas, nós não temos parte nesta guerra de palavras, não temos nenhum interesse em saber quem pede desculpas a quem, e por isso, tomar a posição mais conciliadora não é nada de condenável... antes outros fizessem assim... de ambos os lados, é claro!

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  4. Caricaturas, Meu Deus!
    Podem uns simples desenhos insultar tanto alguém? Sim.
    Ao ponto de levar metade do Médio Oriente a um estado de insurreição completo? Não. Mas foi o que aconteceu. Pela simples razão de isso convir a certos grupos radicais Islâmicos, a Estados intolerantes (Islâmicos e Ocidentais), e de ser alimentado pelos media de forma gratuita e sensacionalista.

    Pelo que sei, as polémicas e, na realidade, ofensivas caricaturas ( tentemos vê-las à luz da crença Islâmica,por momentos...não à nossa!) foram primeiramente publicadas num obscuro jornaleco regional Dinamarquês em Setembro de 2005. Posteriormente terão sido recolhidas por um membro da comunidade Islâmica na Dinamarca e enviadas para os países árabes nos quais aguardaram meses até serem reveladas com tanto repúdio.
    A diplomacia internacional actual subsiste ainda apesar do "cancro" que é o conflito Israelo/Árabe, presa por fios, é certo. Todos estes acontecimentos, juntando-os ao braço-de-ferro com o Irão, a vergonhosa intervenção no Iraque e o ódio geral a tudo que vem da Europa, e acima de tudo, dos EUA, não foram senão um rastilho para o que se passou. Ou visto doutra forma, a desculpa para.

    Acho que a posição do MNE foi sensata e equilibrada, não defendeu os valores da liberdade de expressão e democracia porque eles não foram abalados, ponto final. As caricaturas foram publicadas, não foram?

    Há muito extremista à espera que os verdadeiros homens da liberdade cometam o erro de se "deixar levar na cantiga". De ambos os lados instala-se então uma paranóia que leva a atitudes segregacionistas e xenófobas tentando incutir a ideia de que é impossível vivermos em conjunto e em respeito mútuo. Mais que tolerância,Respeito.

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